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Lei de delação premiada agita empresas

23/02/2012
Preocupadas com lei dos EUA que pune suborno de políticos, companhias brasileiras adotam códigos de conduta.

Para evitar problemas futuros, algumas empresas criam normas internas e monitoram gastos e funcionários.

FILIPE COUTINHO
DE BRASÍLIA

Uma lei americana que pune o suborno de políticos e premia em mais de US$ 100 mil os delatores está mudando a rotina de empresas brasileiras, preocupadas com multas milionárias.

A Lei Dodd-Frank começou a valer em agosto de 2011 para premiar delatores em 10% a 30% das multas acima de US$ 1 milhão, aplicadas nos EUA. Para isso, é preciso fornecer informação exclusiva que comprove a propina a políticos, inclusive brasileiros.

O fundo para premiar delatores é de US$ 450 milhões.

A lei vale para filiais de multinacionais ou empresas com ações na Bolsa dos EUA e até mesmo para irregularidades das terceirizadas.

Antes dessa lei, os EUA já puniam a corrupção estrangeira no FCPA (Foreign Corrupt Practices Act), mas sem a delação premiada.

"Agora a coisa começou a esquentar e é natural que a Dodd-Frank passe a ser mais uma preocupação. A empresa se convence de que o prejuízo é maior se deixar correr solto", diz o advogado André Fonseca, que atende empresas sobre a lei americana.

Companhias como CPFL e Braskem, com ações na Bolsa, e multinacionais como Qualicorp e Kimberly-Clark já criaram normas internas para se prevenir e adotar uma agenda corporativa ética.

A ideia é se antecipar aos problemas, monitorando funcionários e gastos.

Há canais internos para denunciar colegas -e assim ter o controle de potenciais danos à empresa.

"Não é colocar o funcionário na parede, é colocar a ética como uma parte operacional. A denúncia não será feita aos EUA se aqui há um canal isento", afirma Lucia Helena Magalhães, gerente de relacionamento da CPFL.

Funcionários, fornecedores e terceirizados também são obrigados contratualmente a seguir a legislação americana.

"A complexidade das leis anticorrupção não alivia a responsabilidade. Deve-se consultar o departamento jurídico antes de autorizar, oferecer, prometer ou pagar algo de valor se houver dúvida", determina o código de conduta da Kimberly-Clark.

A responsável por segurança empresarial na Braskem, Olga Pontes, compara a lei americana ao uso de cinto no carro, adotado ou por segurança ou para evitar multas de trânsito. "A lei é uma forma de instrumentalizar a cultura anticorrupção."

Um dos reflexos da lei é o aumento de auditorias no Brasil.

Hoje, metade da receita das investigações da PricewaterhouseCoopers no país já vem por conta da lei dos EUA. Eram três investigadores em 2009. Agora, são 30.

Na Ernst & Young Terco houve aumento de 100% nas investigações encomendadas por estrangeiros para saber o risco de fechar negócios no Brasil.

Desde o ano passado, 40 empresas discutem a lei no Instituto Brasileiro de Direito Empresarial. Segundo o advogado Bruno Maeda, coordenador no instituto, a prevenção pode reduzir a responsabilidade da empresa em caso de condenação.

MULTAS MILIONÁRIAS

A maior multa da história foi aplicada à Siemens -mais de US$ 400 milhões. No Brasil, a empresa montou um sistema de investigação com 45 pessoas que levou ao afastamento do seu executivo-chefe no ano passado.

Em 2011, os EUA receberam 13 denúncias -nenhuma de brasileiros até o momento.

Sem delação premiada, a Embraer está sob investigação por corrupção nos Estados Unidos.

No Brasil, no caminho contrário, a suíça Alstom foi alvo de suspeitas em contratos com o Metrô de São Paulo.

Governo quer 'nacionalizar' legislação

DE BRASÍLIA

A lei norte-americana que pune empresas por suborno a políticos pode ter sua versão brasileira aprovada neste ano na Câmara dos Deputados, mas sem delação premiada.

O governo federal enviou ao Congresso Nacional um projeto de lei que reprime a corrupção estrangeira. Segundo a CGU (Controladoria-Geral da União), a lei vai "suprir uma lacuna jurídica" para punir financeiramente as empresas corruptoras.

Pelo projeto, as empresas serão obrigadas a reparar integralmente o prejuízo causado, além de ter de pagar multa de até 30% do faturamento bruto.

As multas poderão ser aplicadas inclusive em processos administrativos pelo próprio órgão público que fez a licitação.

A CGU investigará os casos de corrupção estrangeira.
A previsão do relator, Carlos Zarattini (PT-SP), é aprovar o projeto ainda no primeiro semestre. Depois, o texto vai para o Senado.

Análise

Incentivo da recompensa traz risco de gerar círculo vicioso

ISABEL FRANCO
ESPECIAL PARA A FOLHA

A legislação de combate à corrupção chegou para valer às empresas. Algumas leis podem não pegar, mas essas, principalmente as norte-americanas, estão revolucionando as relações empresariais no mundo todo.

A lei americana FCPA (Foreign Corrupt Practices Act), já conhecida dos brasileiros, por exemplo, embora a rigor não se aplique diretamente ao Brasil, tem um impacto prático contundente.

Isso porque as empresas americanas com filiais no Brasil são tão cautelosas ao contratar terceiros que, antes, fazem uma verdadeira devassa na vida do futuro contratado. Ao menor sinal de má reputação, a filial americana encerra as negociações.

Em outro exemplo, aqueles famosos "consultores" que existem somente para dar um jeitinho nas repartições públicas estão com seus dias contados com as empresas estrangeiras.

Precavendo-se para evitar que o contratado venha a pagar propina, comprometendo a contratante, raramente são aceitas hoje em dia as famosas "taxas de sucesso".

Outra norma norte-americana que vem sacudindo o cenário empresarial global é a Lei Dodd-Frank.

Pelo programa, a SEC (entidade equivalente à CVM) pode recompensar delatores em 10% a 30% das quantias recuperadas quando as informações fornecidas pelos denunciantes levem à condenação de uma empresa.

O programa é polêmico porque empresas têm se esforçado para adotar programas de boas condutas e ética para cumprir com a legislação anticorrupção.

Mas, com essa lei, os esforços podem ser tripudiados porque os delatores têm um forte incentivo em denunciar às autoridades em vez de à sua própria empresa, à caça da recompensa. Aí, forma-se um círculo vicioso e nefasto.

Enquanto a empresa se empenha em combater as propinas treinando seus empregados e até fornecedores, representantes e distribuidores, essas pessoas podem estar mais interessadas na recompensa do que em ajudar a companhia a combater a corrupção.

Ainda mais porque a lei garante proteção contra retaliação do empregador, que pode ser processado em caso de demissão ou de discriminação do delator.

ISABEL FRANCO é advogada, sócia do escritório Koury Lopes Advogados, especialista em legislação anticorrupção.

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