O abuso do poder de mercado



21/07/2016

 As empresas, cada vez mais, são geridas por executivos focados no lucro de curto prazo, por exigência dos acionistas e incentivados pelos bônus anuais.

Nem acionistas nem executivos estão comprometidos com a própria empresa no longo prazo e muitas vezes põem em risco o seu futuro com medidas temerárias e muitas vezes ilegais para assegurar o lucro do final de ano. Estamos sendo constantemente surpreendidos por empresas tradicionais e aparentemente sólidas envolvidas em graves problemas financeiros ou legais decorrentes dessa visão. Se não há comprometimento com a própria empresa, o que se pode dizer em relação à preocupação com o fornecedor ou até mesmo com o cliente?

Por outro lado, a concentração que se observa na maioria dos setores empresariais tem reduzido a concorrência e aumentado o poder de mercado das empresas, que cada vez mais se impõem sobre seus clientes e fornecedores. Isto é muito visível no setor do agronegócio onde a relação entre produtores e indústria se tem deteriorado à medida que o setor industrial se concentra, carteliza e verticaliza.

No setor da citricultura, a concentração e a verticalização vêm produzindo profundas transformações no setor, com enormes prejuízos econômicos e sociais para o país e para o mercado.

O gráfico abaixo mostra claramente a capacidade dos elos mais organizados da nossa cadeia produtiva de ampliar suas margens em detrimento dos citricultores e dos consumidores.



Fica claro no gráfico acima que o aumento do preço do suco ao consumidor norte- americano não tem nenhuma vinculação com o preço do suco a granel cotado na Bolsa de Nova York, que é a referência da remuneração ao citricultor. A questão se torna ainda mais grave quando se observa que o preço do suco não é determinado pela oferta e demanda, pois, apesar da queda de demanda, os preços continuam a aumentar, aparentemente na tentativa de manter o faturamento.

As consequências observadas são a destruição do mercado em decorrência da queda de demanda, empobrecimento dos produtores, destruição da infraestrutura criada para atender o modelo de citricultura baseado em pequenos e médios produtores, que gerava e distribuía renda e empregos. Esse modelo está sendo substituído por um sistema excludente de grandes pomares, menos eficientes, e, ao contrário do que ocorria, não levam benefícios aos municípios nos quais se instalam.

O setor demanda políticas públicas que assegurem ao citricultor uma participação justa e compatível com os investimentos e riscos, na renda da cadeia produtiva, como ocorre na Flórida, segundo maior produtor de suco de laranja do mundo onde o sistema de remuneração, sugerido pela Coca Cola, liga o preço da laranja ao preço do suco ao consumidor, o que tem assegurado ao produtor americano preço da caixa de laranja em torno de US$ 14,00, apesar da tão propalada queda de demanda do suco no mercado norte-americano.

A solução dos problemas da citricultura não se limita à remuneração, mas este é o ponto fundamental. A solução passa por uma mudança profunda na cultura do produtor agrícola que assume os maiores investimentos, custos e riscos e, devido a sua desorganização e individualismo tem transferindo sua renda e patrimônio aos elos mais organizados da nossa cadeia produtiva.